segunda-feira, 29 de agosto de 2011


MINHAS ROUPAS SAEM E VOLTAM
(Cândido Portinari)
 
Minhas roupas saem e voltam
Sem mim – acompanham gentes
Não falam, mas se amarrotam
Tristes roupas nem frases ouvem
 
Mesmo horizontais. Fico nu.
Miúdo, desengonçado sem serventia
Se ainda fosse amigo do rei.
 
Pobre dono de panos, não posso
Sair também, já nem corpo tenho.
Nada me vê e não me falam
Quando me perdi?
 
Se estivesse ainda naquela rua
Fugi de mim? Pegaram-me de
Propósito jogando-me fora, aos pedaços ...
 
Acordei antes da morte?
Quem soprou-me a realidade?
Via as areias, areias de meu
Povoado pouco pisadas.
 
Brilhavam sempre
Noites frias e estreladas.
Mesmo mal-assombradas
Havia as vozes boas e os ruídos
 
Caseiros. Almas infantis
Dos anjinhos. Sepultados na
Véspera. Habitavam o espaço
Levando o perfume
 
De rosas e de cravos
Tão verdadeiro e
Tão inexistente ...

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